Jovem com nanismo já trabalhou na Polícia Militar de Santa Catarina e é digital influencer
Em um mundo onde as adversidades frequentemente traçam limites, Júlia Kretschmer, nascida e criada em Jaraguá do Sul, Santa Catarina, se destaca como um verdadeiro exemplo de superação e determinação. Diagnosticada com nanismo, a jovem de apenas 22 anos desafiou as expectativas ao conquistar não apenas um, mas três cursos em Harvard, uma das instituições de ensino mais prestigiadas do planeta.
Júlia é formada em direito e está finalizando duas pós-graduações.
A trajetória de Júlia é marcada pela inspiração e pela luta contra preconceitos, que nunca a impediram de seguir seus sonhos. Além de sua formação acadêmica, ela também trabalhou durante quatro anos e meio na Polícia Militar de Santa Catarina, onde contribuiu de forma significativa para a segurança pública. Agora, como influenciadora digital, Júlia usa sua plataforma para incentivar outras pessoas a serem resilientes, mostrando que a deficiência não é um obstáculo, mas sim uma oportunidade para brilhar ainda mais. Ela conta seu dia-a-dia, hábitos, fala sobre políticas públicas e mostra seu lifestyle.
Com sua história, Júlia prova que, com persistência e dedicação, é possível alcançar qualquer objetivo, independentemente das dificuldades enfrentadas. "Eu sempre acreditei que podia ir além, e hoje, quero que mais pessoas saibam que também podem", afirma com um sorriso contagiante.
Confira a entrevista que Júlia concedeu à Annabra.
Annabra - Como seus pais descobriram o diagnóstico de nanismo?
Júlia - Eu nasci com acondroplasia, que é o tipo mais comum de nanismo. O diagnóstico foi feito durante a gestação, mas se confirmou quando nasci, após realizar diversos exames para entender a minha condição. Eu tenho 22 anos, na época, a medicina já obtinha as informações, mas acredito que hoje em dia seja bem mais fácil, ainda mais que hoje existem medicamentos para melhorar a condição de vida da pessoa que nasceu com nanismo e as informações são mais acessíveis.
Annabra - Como foi a sua infância, você se sentia diferente das outras crianças?
Júlia - De forma nenhuma. A minha infância, eu até brinco, foi uma infância dos sonhos. Os meus pais sempre me proporcionam uma infância muito rica, e não estou falando em questões exclusivamente financeiras, mas tive as mesmas oportunidades de crianças com estatura normal. Não me sentia, de forma alguma, diferente das outras crianças, pois sempre me foi explicado que a minha condição era que simplesmente "você vai ficar menor do que as outras crianças, apenas isso". E, ao meu redor, não sentia essa diferenciação. Sempre era rodeada de amigos, brincava de tudo, fazia diversas extraclasses no colégio, sendo eles: fiz teatro, cantava no coral do colégio, tocava violão e violino, participava de orquestras e de bandas, dançava ballet, jogava xadrez. Eu sentia o preconceito quando saia do meu meio, da minha bolha social, e acabava indo a lugares desconhecidos. Os olhares eram inevitáveis e, às vezes, os pais das crianças não queriam que seus filhos chegassem perto. Só que, graças a Deus, sempre tive uma criação muito boa e uma autoconfiança imensa de quem eu era, e jamais me deixava abalar ou frequentar os lugares. Infelizmente, o preconceito é algo que preciso conviver até o resto da minha vida, porém, ele diz muito mais sobre as outras pessoas do que a minha simples condição física.
Annabra - E como foi passar pela adolescência? Sentiu preconceito pela sua condição?
Júlia - A minha adolescência foi similar a minha infância. Eu sempre me dediquei profundamente aos estudos e em ter o meu espaço na sociedade, por mais que fosse concorrido e difícil. Tiveram episódios de preconceito, mas nada que não soubesse lidar.
Annabra - Quando se interessou por direito? Que experiências você vivenciou na faculdade?
Júlia - Eu me interessei em estudar direito no segundo ano do ensino médio, retornando de uma viagem a Joinville, do qual era a segunda ou terceira fase da Olimpíada de Física. O meu professor de física veio me perguntar qual era o vestibular que iria prestar, e eu disse que, na época, queria fazer Engenharia Civil ou Arquitetura e Urbanismo. Ele virou para mim, como um professor experiente e que acompanhava de perto a minha trajetória, e disse que eu tinha uma vocação e uma certa afinidade para o ramo do direito. E ele estava certo. Passei a ver os diversos ramos do direito e me encantei por aquilo, especialmente na área de segurança pública.
Annabra - Como surgiu a oportunidade de fazer os cursos em Harvard?
Júlia - Assim que me tornei Bacharel em Direito, busquei complementar a minha formação com alguns cursos. Comecei a fazer duas pós-graduações, e, em seguida, procurei cursos livres para fazer. E me deparei com a oportunidade de me inscrever em três cursos na Universidade de Harvard, de forma online, e me inscrevi para ter uma bolsa de estudos. E fui contemplada. E foi uma oportunidade incrível, uma realização de um sonho adolescente, uma experiência que fogem as palavras. Foi extremamente fundamental e essencial para a minha formação e está contribuindo positivamente no meu trabalho, e também, na minha vida pessoal.
Annabra - Você trabalhou na Polícia Militar. Como foi seu trabalho? Que ensinamentos você tirou desse período ?
Júlia - Eu trabalhei na Polícia Militar de Santa Catarina durante quatro anos e meio na condição de estagiária, e em seguida, como Agente Temporária. No quartel, como a minha função era exclusivamente administrativa, percorri diversos setores, desde o monitoramento das cidades, setor de trânsito, setor de patrimônio, logística, financeiro, e por fim, gestão de pessoas. Sem dúvida, estar na Polícia Militar contribuiu significativamente na minha vida. Existe uma Júlia antes de entrar na PM, uma durante os quatro anos, e depois, uma Júlia que saiu da PM com uma bagagem extrema de conhecimentos, de experiências, de vivências, de histórias. Uma Júlia que percebeu o valor do ser humano e entendeu profundamente os conceitos de ética, honra, disciplina, hierarquia. Jamais me senti desrespeitada na PM por conta da minha condição. Pelo contrário, foi um dos lugares que mais me senti respeitada na minha vida. Nunca a minha condição física foi colocada à prova de algo ou alguma coisa, tanto que sai de lá com as portas abertas para um dia poder retornar.
Annabra - E sobre seu trabalho como digital influencer. Como é essa parte da sua vida? O que você mais gosta de postar ?
Júlia - Ser digital influencer é algo extremamente orgânico. Eu sempre gostei de compartilhar meu dia a dia, sem aquele desejo de querer ser famosa ou algo do tipo. Não é o meu principal ofício, mas eu gosto de compartilhar o meu dia a dia, dicas de beleza, moda, e, principalmente, compartilhar as minhas conquistas para inspirar a vida de outras pessoas, com nanismo ou não. É algo tão natural e tão espontâneo, que não parece ser um trabalho, e sim, uma diversão. E aproveito de um certo tipo de relevância que tenho para falar sobre a minha condição, sobre implementação de políticas públicas e o quão fundamental é olhar para as famílias e as pessoas com nanismo. Acredito que através do meu conhecimento e da minha história de vida, posso contribuir positivamente em prol de uma sociedade muito melhor. Acredito que esse seja o meu propósito de vida.
Annabra - Quais são seus planos para 2025?
Júlia - Como os meus planos já foram traçados há algum tempo, para 2025 pretendo dar continuidade aos meus trabalhos, aos meus estudos, e principalmente, estar presente e ativa nas causas que acredito. Quero estar mais perto das pessoas, das suas histórias de vida e criar algo que possa fazer a diferença na vida delas, e consequentemente, na minha. Sou uma pessoa realizada e feliz por toda trajetória até aqui, e acredito que dar longevidade a tudo isso seja o segredo e o meu propósito de vida.
Siga a Júlia no insta: @juliakretschmer
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