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“As pessoas precisam entender que a minha capacidade não tem relação com o meu tamanho”

Juliana Caldas, atriz com nanismo, fala da falta oportunidades na área artística para que tem deficiência


A atriz paulistana Juliana Caldas ficou conhecida nacionalmente pelo papel na novela “O Outro Lado do Paraíso”, de Walcyr Carrasco, exibida entre 2017 e 2018 na TV Globo. Ela interpretou Estela, jovem maltratada pela mãe, Sophia (Marieta Severo), por ter nascido com nanismo.

Foi a primeira vez que um personagem com nanismo foi retratado em rede nacional. A oportunidade abriu portas para Juliana, que trabalha no meio artístico desde os 16 anos. Nesse bate papo, ela conta um pouco da sua trajetória no teatro e televisão, os desafios da profissão por ser uma pessoa com nanismo e as novas oportunidades que estão surgindo para as pessoas com deficiência. Aproveite e acompanhe seu trabalho no instagram - @juzinha.caldas


Annabra - Como foi sua trajetória profissional e sua entrada no mercado das artes?

Juliana – A minha trajetória artística começou quando eu tinha 16 anos. Com a morte da minha mãe, eu precisei ajudar em casa e fiquei sabendo de uma vaga no Parque da Xuxa, aqui em São Paulo. Eu entrei e comecei a trabalhar aos finais de semana e feriados. Nós fazíamos a sessão de fotos com os personagens e os talk shows com os personagens. Eu entrei para fazer um extra, mas acabei conhecendo mais a fundo o mundo das artes. Eu conversava bastante com os atores que trabalhavam comigo, fazia algumas aulas e exercícios teatrais.

Continuei no parque até meus 19 anos e durante a semana eu trabalhava em um banco. Nessa época, apareceu um teste para uma peça infantil, daí eu pedi demissão do banco e do parque para ficar no teatro. Com 23 anos eu tirei o meu DRT (registro profissional) para trabalhar como atriz. Trabalhei em muitas peças infantis e em espetáculos. Fiz parte de uma companhia de teatro, sempre lendo muito e estudando sobre a minha área.


Annabra - Quais são os principais desafios que as pessoas com nanismo enfrentam ao buscar oportunidades de trabalho?

Juliana – O principal desafio é a falta de oportunidades na área artística. Hoje em dia a gente trabalha para que novas oportunidades apareçam. Antigamente não tinha muitas pessoas com deficiência atuando, a não ser quando se fazia evento em que usavam pessoas com nanismo para personagens pejorativos ou no lado mais cômico. Até eu mesmo cheguei a fazer alguns eventos desse tipo.

Eu trabalhei por muitos anos em uma companhia que fazia espetáculos infantis, que era onde cabia personagens com a minha deficiência. Porém, chegou uma época em que eu não quis mais fazer esses papéis. Daí fui conduzindo a minha carreira para outras áreas até para desmistificar o pensamento de que pessoas com nanismo só podem trabalhar em peças infantis.

As pessoas precisam entender que a minha capacidade não tem relação com o meu tamanho. E compreender que eu sou apta e capaz de fazer qualquer personagem em qualquer trabalho.


Annabra - No campo das artes, vemos que ainda há poucos papéis que representam de forma justa pessoas com nanismo. Como isso impacta a carreira de atores e atrizes com essa condição?

Juliana - Fazer a novela “Do Outro Lado do Paraíso” foi uma abertura de portas e caminhos maravilhosos, principalmente porque foi em horário nobre na Globo. Eu fui uma das primeiras a falar sobre o nanismo através do Walcir Carrasco. Hoje em dia eu já fiz outras personagens que não tem nenhuma relação com o nanismo.  

Até mesmo depois de 8 anos da novela eu vejo um crescimento muito simbólico na questão da representatividade. Obviamente quando a gente falou de nanismo na novela foi dada abertura para se tratar do nanismo em todas as áreas, não só na arte.

Mas, se a gente tem representatividade nas artes é preciso que a população consuma esse conteúdo. O trabalho da arte é informar, fazer pensar e questionar. Talvez seja por isso que, infelizmente, a arte não seja tão valorizada no Brasil.


Annabra- O que pode ser feito para tornar o mercado de trabalho mais inclusivo?

Juliana – A busca por informação. Quanto mais informação você tem, vai perceber que o seu pensamento é muito pequeno em relação às pessoas.  É preciso abrir a cabeça, se atualizar sobre as diferenças. Quando você convive com o diferente agrega muito mais conhecimento. A inclusão tem que existir em todos os lugares, a escola tem que ser inclusiva, a academia tem que ser inclusiva. Quantos mais espaços inclusivos mais pessoas vão compartilhar esses locais.

Eu falo sempre, nas rodas de conversa no teatro, que as pessoas, que não tem deficiência, sempre questionam a necessidade de locais adaptados. Mas é preciso se colocar no lugar do outro porque, de um dia para o outro, você pode se tornar uma pessoa com deficiência e vai precisar de espaços adaptados.

O que falta no mercado de trabalho e no mundo é a empatia para ser mais inclusivo, além de respeito e amor ao próximo.


Annabra - Qual conselho você daria para quem tem nanismo e quer seguir uma carreira em áreas que ainda apresentam barreiras?

Juliana – Todas as áreas apresentam barreiras para a pessoa com deficiência. O meu conselho é: só vai! Não há uma receita certa. Cada pessoa é uma pessoa e as vezes o que funciona para mim não funciona para o outro. Eu acho que em primeiro lugar você precisa se conhecer, se amar porque isso faz uma grande diferença. É preciso ter consciência dos seus direitos, o que quer ou não fazer. E ter coragem e força para receber alguns nãos, mas não desistir e seguir em frente.


Annabra- Em que peça você está atuando atualmente?

Juliana – Eu estou em cartaz com a peça “Meu Corpo Está Aqui”, que está viajando pelo país através do Circuito Sesc. A peça é baseada nas minhas experiências pessoais, do Bruno Ramos, Rafa Muller e Pedro Henrique França, todos atores com deficiência. Nós entramos em cena falando abertamente sobre nossos relacionamentos, corpos e desejos.

Nós retratamos o jogo entre as pulsões e os obstáculos que se apresentam nas descobertas e nas experiências de afeto e sexualidade.

 
 
 

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